27 de fevereiro de 2011

Cântico Negro


Imagem de google

"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.


Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!

de José Régio

23 de fevereiro de 2011

À Morte


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Morte, minha Senhora Dona Morte,
Tão bom que deve ser o teu abraço!
Lânguido e doce como um doce laço
E, como uma raiz, sereno e forte.

Não há mal que não sare ou não conforte
Tua mão que nos guia passo a passo,
Em ti, dentro de ti, no teu regaço
Não há triste destino nem má sorte.

Dona Morte, dos dedos de veludo,
Fecha-me os olhos que já viram tudo!
Prende-me às asas que voaram tanto!

Vim da Moirama, sou filha de rei,
Má fada me encantou e aqui fiquei
À tua espera... quebra-me o encanto!


de Florbela Espanca

18 de fevereiro de 2011

Fata-me


Imagem do google

Falta-me
Soltar ao sabor do vento
Seguindo o meu caminho
Dizendo baixinho...
Tudo o que eu sinto
Falta-me
Murmurar palavras não ditas
Emoções sentidas...
Embalando com carinho o meu coração
Falta-me
Gritar...gritar...
Sons do meu silêncio
Solidão dos meus sonhos
Refúgio do meu olhar...

de Sónia Caires
( Imagem Google )

12 de fevereiro de 2011

Que Mundo


Estou num Mundo que não é o meu.
Nada me diz...
O caminho é um profundo vazio.
Só ilusões!
Tanta mentira!
Onde está a verdade?
A desilusão é tão profunda que todo o meu Ser entra em contradição.
Sou obrigada a viver...
Tento sobreviver...nada mais.
Fujo da escuridão de maldades.
Procuro buscar forças no azul do mar.
Escuto o bater das ondas.
Eu Aqui...
Aquele Mundo lá...
Tudo está em harmonia.
Longe...bem longe daquele Mundo que não é o meu.


de Sónia Caires
( Imagem Google )

5 de fevereiro de 2011

Diz-me...

Foto de Duarte Camacho

Oh mar!
Diz-me...
Diz-me qual o caminho?
A estrada que devo sonhar
As encruzilhadas são tantas
Minha alma não descansa
Aceditando no inacreditável
Tentando...
Sentir a simplicidade da vida
Em busca de um novo amanhecer
Cantando ao som vento
Sentindo o azul do céu
Trazendo nova esperança
Semeando o poder do Amor.
Oh mar!
Diz-me...

de Sónia Caires